O teletrabalho não deve ser um exercício solitário

De acordo com um inquérito realizado em junho de 2020 sobre teletrabalho pela Opinion Way, 88% dos inquiridos que teletrabalharam durante o confinamento consideraram a experiência satisfatória ou até muito satisfatória.

Esta satisfação foi impulsionada pela sensação de ter mais flexibilidade e agilidade para gerir o seu trabalho, e de dispor de mais autonomia e responsabilidade. Os benefícios sentidos em termos de empenho e eficiência no trabalho, de equilíbrio entre a vida profissional e a vida familiar têm cada vez mais peso.

Como resultado imediato, agora 9 em cada 10 trabalhadores gostariam de repetir a experiência, metade dos quais vários dias por semana. Temos de estar atentos a esta exigência, sem descurar outro resultado muito importante do estudo: 4 em cada 10 trabalhadores afirmam lamentar a falta de contacto com os colegas quando trabalham à distância, e quase um terço dizem sofrer de isolamento.

 

Dar vida ao espírito de equipa e à coesão à distância

O desenvolvimento do teletrabalho não está, portanto, isento de consequências. Cabe-nos a nós continuar a manter o espírito de equipa e a coesão dentro da empresa, apesar da distância. 

Convém lembrar que uma empresa não é apenas uma soma de competências externas. É, sobretudo, constituída por uma visão, valores, um projeto e uma história comum, que se constrói diariamente, com interações e ligações.

Em suma, o sentimento de pertença vai muito além da descrição detalhada das funções de cada indivíduo e do serviço prestado ou do produto que é fabricado ou montado. Em conjunto.

Para evitar que as ligações sejam distorcidas com o desenvolvimento do teletrabalho, deixamos 3 conselhos vitais para que o teletrabalho não seja um exercício solitário.

 

Ritualizar e organizar pontos de encontro

Para o bem-estar dos trabalhadores e da empresa, é antes de mais essencial estabelecer novas condições para um intercâmbio eficiente e sereno. Em primeiro lugar, de forma sincronizada, durante as reuniões, que são agora organizadas à distância, mas também de forma assíncrona, graças a e-mails ou ferramentas de comunicação e gestão de projetos em colaboração.

Enquanto a comunicação assíncrona oferece mais liberdade e eficiência, a comunicação síncrona permite que todos os trabalhadores da empresa permaneçam ligados.

É essencial marcar reuniões regulares com todos os trabalhadores para comunicar sobre o progresso da empresa, as suas notícias, os seus projetos, os seus sucessos, os dos colaboradores… Isto manterá todas as equipas ao mesmo nível de informação e garantirá o seu envolvimento.

Procurem marcar reuniões semanais, em que o conselho de administração e os gestores falem com todos os trabalhadores e respondam a eventuais perguntas: isto é necessário para assegurar o empenho de todos… e para tranquilizar aqueles que precisam.

Lembrem-se que a preparação de uma reunião virtual requer tanto cuidado como a preparação de uma reunião física. É, portanto, aconselhável comunicar antecipadamente o tema da reunião, os seus objetivos, o seu desenvolvimento, as suas expectativas… para preparar os participantes o melhor possível e evitar, também à distância, reuniões que não servem para nada!

 

Criar novas oportunidades de interação

Este é provavelmente o ponto mais importante para manter o elo de ligação. Para que o espírito de equipa e a coesão do grupo floresçam, será necessário ser inventivo, adaptar-se à cultura da empresa e aos seus trabalhadores para facilitar e multiplicar as interacções com e entre eles.

Não há nenhuma receita pré-estabelecida: tanto se pode elaborar uma carta de equipa indicando a visão de cada um, como dar prioridade a uma arquitetura mais informal. Em qualquer caso, tomar o pulso das equipas, conhecer as suas expectativas e mostrar criatividade são absolutamente necessários para propor as ferramentas certas.

Os instrumentos de colaboração têm provado a sua utilidade a este respeito. Permitem a invenção de novos espaços de comunicação, tais como pausas para café virtual, ou mesmo a criação de canais extra-profissionais dedicados às diferentes paixões dos trabalhadores: cozinha, desporto, viagens… Algumas empresas optaram também por atrair empregados por sorteio para participar em videoconferências e discutir os seus livros ou receitas favoritas, permitindo-lhes assim conhecerem-se melhor uns aos outros.

Embora a maioria deles ainda não tenha aderido ao conceito, as pausas “virtuais” promovem a eficiência e o bem-estar no trabalho, bem como a criatividade e o reforço dos laços sociais.

 

Promoção da empatia e abordagens de inclusão

Num período como aquele que acabamos de viver, as empresas e a direção precisam de estar ainda mais atentas às necessidades reais dos seus trabalhadores e assim encontrar soluções relevantes para os problemas reais que possam encontrar.

Isto requer antes de mais o reforço da empatia, uma habilidade chave para o futuro das organizações. Os gestores podem pôr esta habilidade em prática de forma muito simples, mantendo um contacto regular com os seus trabalhadores, formal ou informalmente, através do envio de mensagens ou da rede social da empresa.

No entanto, isto não significa uma transformação em “control comand”. Com o teletrabalho, os gestores devem aprender a delegar e a confiar. Não precisamos de supervisores, precisamos de coaches: isto aplica-se tanto ao teletrabalho como ao trabalho de escritório. A diferença é que à distância, o sentimento de isolamento, ou mesmo de discriminação, pode ocorrer muito mais rapidamente. Isto significa criar um ambiente de trabalho que seja inclusivo.

Este contexto inclusivo pode traduzir-se por uma reunião semanal, a uma hora definida conhecida por todos, para fazer o balanço dos objetivos e acompanhar os projetos da equipa. Este ritual, a uma data e hora fixas, mantém a dinâmica, dá vida ao espírito de equipa e está totalmente atento às necessidades dos colaboradores.

Imaginemos um caso concreto. Se, durante uma conversa com o seu superior, um trabalhador expressar o desejo de ser acompanhado mais regularmente, o superior dará preferência ao telefone. Por outro lado, se o funcionário desejar ter mais autonomia, a utilização de uma ferramenta de gestão de projetos de colaboração poderá ser suficiente.

O importante é fomentar uma adaptação contínua às necessidades reais e aos perfis dos diferentes trabalhadores, e sobretudo, ser consistente: o contexto de inclusão não é um dado adquirido, é construído através da repetição de hábitos positivos.

 

Alcançar o equilíbrio certo entre o teletrabalho e o interesse coletivo

Mesmo que as ferramentas digitais nos dêem hoje em dia os meios para manter a ligação social entre trabalhadores, não acredito numa mudança generalizada para o teletrabalho a tempo inteiro.

Estamos cientes de que algumas organizações o vêm como o próximo mundo e gostariam de se projetar nele muito rapidamente. No entanto, esta generalização do teletrabalho não é adequada para todas as empresas, nem para todas as profissões. Temos de ter isto em conta.

A empresa permanece acima de tudo um espaço coletivo, onde as questões de intercâmbio e igualdade de tratamento continuam a ser centrais. Sem passar por uma revolução, estamos de facto a assistir a uma profunda evolução nos modos de colaboração, que incluem uma maior percentagem de teletrabalho do que no passado.

O desafio dessa viagem será o de continuar a privilegiar a inclusão num mundo cada vez mais digital. Teremos de estar atentos às diferentes expectativas dos empregados de acordo com a sua categoria, idade, pretensões ou estilo de vida. O melhor equilíbrio possível terá, portanto, de ser encontrado e deverá situar-se a meio caminho entre as necessidades individuais, acentuadas pelos instrumentos digitais, e os interesses coletivos das organizações.

 

Ashley Hindsman
Especialista da Sage dedicada à gestão financeira de Médias Empresas.